A Convenção OIT 169 e o licenciamento ambiental

Posted by lemosadvr

Em 29/01/2019 0 TRF1 publicou decisão que anula licença ambiental por falta de consulta à comunidade indígena. O acórdão deu parcial provimento ao recurso de apelação interposto pela FUNAI para reformar sentença proferida em ação civil pública para determinar o cancelamento de licenças de operação emitidas à implementação de mineroduto instalado na Amazônia Legal.

De acordo com o TRF1 a não realização do de consulta livre, prévia e informada à comunidade
indígena afetada no âmbito do licenciamento ambiental do empreendimento viola os termos da Convenção Internacional da Organização Internacional do Trabalho nº 169 (“OIT 169”) sobre Povos Indígenas e Tribais ratificada pelo Brasil, bem como o artigo 231, §3º da Constituição Federal. Com base nesse entendimento, o Tribunal também condenou a empresa responsável pelo mineroduto a retirar a tubulação da área indígena e a indenizar os danos ambientais resultantes da sua instalação irregular.

Destacamos trecho do voto do relator:

De ver-se, assim, que, em se tratando de consulta prévia, a sua realização haverá de preceder o próprio ato de autorização do empreendimento, hipótese não ocorrida, na espécie, não se podendo admitir a sua inclusão como mera condicionante a ser cumprida durante o respectivo licenciamento ambiental, por se tratar de condição sine qua non para a sua realização, conforme, inclusive, já decidiu este egrégio Tribunal, em caso similar, nestes termos:

CONSTITUCIONAL, ADMINISTRATIVO, AMBIENTAL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO

CIVIL PÚBLICA. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. EXPLORAÇÃO DE RECURSOS

ENERGÉTICOS EM ÁREA INDÍGENA. USINA HIDRELÉTRICA DE BELO MONTE, NO

ESTADO DO PARÁ. AUTORIZAÇÃO DO CONGRESSO NACIONAL (DECRETO

LEGISLATIVO Nº. 788/2005) DESPROVIDA DE AUDIÊNCIA PRÉVIA DAS

COMUNIDADES INDÍGENAS AFETADAS. VIOLAÇÃO À NORMA DO § 3º DO ART. 231

DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL C/C OS ARTS. 3º, ITEM 1, 4º, ITENS 1 E 2, 6º, ITEM 1,

ALÍNEAS A, B, E C, E 2; 7º, ITENS 1, 2 E 4; 13, ITEM 1; 14, ITEM 1; E 15, ITENS 1 E 2,

DA CONVENÇÃO Nº. 169/OIT. NULIDADE. OMISSÃO DO JULGADO. OCORRÊNCIA.

EFEITOS MODIFICATIVOS. POSSIBILIDADE

Os instrumentos da democracia participativa foram criados para aperfeiçoar a legitimidade das
decisões estatais,  originalmente no âmbito legislativo e atualmente na esfera administrativa. No licenciamento ambiental, a audiência pública é modalidade participação popular, geralmente facultativas, cuja finalidade é expor o conteúdo do Estudo de Impacto Ambiental EIA, dirimir dúvidas, esclarecer o acatar sugestões e críticas. Com relação aos povos indígenas e tribais, o procedimento para sua oitiva, embora prevista na OIT 169, se assemelha à das audiências públicas, diante da ausência de regulamentação da mesma.

Embora a oitiva das comunidades ocupe destaque porque possui o condão de influenciar no projeto original da obra, a AGU regulou algumas questões indígenas na Portaria AGU 303/12, na qual preceituou:

 

O usufruto dos índios não se sobrepõe ao interesse de defesa nacional; instalação de bases, unidades e postos militares e demais intervenções militares, a expansão estratégica da malha viária, a exploração de alternativas energéticas de cunho estratégico e o resguardo das riquezas de cunho estratégico, a critério dos órgãos competentes ( Ministério da Defesa), serão implementados independentemente de consulta às comunidades indígenas envolvidas ou à FUNAI.

 

Com relação à obrigatoriedade da consulta prévia às comunidades indígenas, tanto pela Convenção OIT 169 quanto pela Constituição (art.231§3º), a consulta é necessária quando o empreendimento estiver em terras indígenas. Ou seja, a oitiva não será necessária quando houver impacto, ainda que direto.

Por fim, a oitiva tem que anteceder a implementação da obra, não se fazendo necessária quando da tomada de decisão ou dos estudos prévios. O que a Convenção proíbe é uma decisão imutável (concessão de Licença de Operação), antes da oitiva. Se o Estado autoriza alguma obra ou atividade que afete diretamente os índios e que é sujeita a mudanças – ao licenciamento ambiental por exemplo – que podem influenciar na própria concepção, a decisão não é nula.

 

TRF1, Quinta Turma, AC 0019772-56.2006.4.01.3400, Rel. Des. Federal Souza Prudente, DJe. 29 de Janeiro de 2019.

Licenciamento Ambiental/Eduardo Fortunado Bim – 4 ed. Belo Horizonte: Fórum, 2018.

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