Comentários sobre o PL das Fake News

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04/05/2023

Adriana Garibe

Como advogada especialista em Direito Digital, é com grande preocupação que acompanho a discussão em torno do Projeto de Lei das Fake News (PL 2630/2020), o qual institui a Lei Brasileira de Liberdade, Responsabilidade e Transparência na Internet. A proposta, que tem por objetivo primordial combater a disseminação de notícias falsas na internet, tem gerado intenso debate entre especialistas, juristas, políticos e a sociedade em geral.

Nesse sentido, na última terça-feira (dia 02 de maio), o Ministro Alexandre de Moraes determinou a oitiva dos presidentes das empresas Google, Meta, Spotify e Brasil Paralelo, destacando que as plataformas digitais devem excluir quaisquer textos que contenham críticas contra o referido projeto. E, ainda, as empresas devem informar quais as providências adotadas no sentido de coibir a disseminação de conteúdos falsos elaborados por terceiros. A votação do PL que estava prevista para o mesmo dia, no entanto, restou adiada por decisão do Presidente da Câmara, Arthur Lira, sob alegação de que não houve tempo hábil para analisar as sugestões de alteração.

O PL 2630/2020 traz uma série de medidas que visam garantir a segurança e a privacidade dos usuários da internet, bem como coibir a disseminação de informações falsas e o uso indevido das redes sociais. Dentre as principais medidas previstas no projeto, destacam-se:

  • Obrigatoriedade de identificação dos usuários de redes sociais e aplicativos de mensagens, por meio de cadastro com número de telefone celular e CPF, restringindo, assim, o funcionamento de contas geridas por robôs. Em contrapartida, são permitidos perfis com conteúdo humorístico ou paródia;
  • Obrigatoriedade de guarda de dados para fins de investigação criminal;
  • Criação de mecanismos para coibir a criação de contas falsas e a disseminação de notícias falsas;
  • Responsabilização das plataformas de redes sociais pela remoção de conteúdo considerado falso ou ofensivo;
  • Criação de um Conselho de Transparência e Responsabilidade na Internet, com o objetivo de estabelecer regras de transparência e responsabilidade para as plataformas de internet, composto por representantes do poder público, da sociedade e do setor privado;
  • Penalidades para empresas que descumprirem as normas estabelecidas no projeto, que podem começar com advertência, podendo chegar a multas e até mesmo a suspensão das atividades[1].

Apesar de louvável em sua intenção de combater a disseminação de notícias falsas, o PL 2630/2020 tem sido criticado por alguns setores da sociedade, que argumentam que a proposta pode ferir a liberdade de expressão e o direito à privacidade dos usuários da internet. Em outras palavras, o PL está sendo acusado de causar censura. De fato, em que pese a justa preocupação com a desinformação, algumas das medidas previstas no projeto podem representar uma violação de direitos fundamentais se não forem bem aplicadas.

A Autoridade Nacional de Proteção de Dados, na qualidade de órgão fiscalizador da Lei Geral de Proteção de Dados, preocupada principalmente com a proteção dos dados pessoais dos indivíduos, também entrou no debate e realizou uma análise preliminar do referido projeto. De saída, a ANPD destacou que diversos artigos de lei previstos no PL se sobrepõem às regras já trazidas pela LGPD, de modo que podem fomentar conflitos sobre a competência da ANPD, uma vez que o PL atribui competência de fiscalização e aplicação de penalidades a uma “entidade autônoma de supervisão”.

Em sendo assim, a ANPD sugeriu que o PL enfatize e preserve as competências conferidas a ela por meio da LGPD. A ANPD também alerta que o PL estabelece conceitos vagos e expressões imprecisas como “quaisquer dados e metadados envolvidos” quando trata, por exemplo, da coleta e guarda de dados pessoais para investigação criminal. Segundo a ANPD esses conceitos e expressões precisam ser mais bem detalhados a fim de evitar uma ampliação indevida da possibilidade de coleta de dados.

De qualquer sorte, é preciso reconhecer que a disseminação de notícias falsas na internet representa um grave problema para a democracia e para a sociedade como um todo. A desinformação pode levar a conflitos, agravar crises políticas e sociais, prejudicar a saúde pública e até mesmo ameaçar a segurança nacional, a exemplo dos recentes ataques em diversas escolas espalhadas pelo Brasil. Assim, é fundamental encontrar um equilíbrio entre o combate às fake news e a garantia dos direitos fundamentais dos usuários da internet. É preciso que o PL 2630/2020 seja devidamente aperfeiçoado, considerando, principalmente as sugestões da ANPD, para garantir que as medidas previstas na proposta não representem censura e uma ameaça à liberdade de expressão e à privacidade dos usuários da internet e ao mesmo tempo possam ser eficazes no combate à disseminação de notícias falsas.

[1] https://www.camara.leg.br/noticias/673694-projeto-do-senado-de-combate-a-noticias-falsas-chega-a-camara/

https://www.gazetadopovo.com.br/vida-e-cidadania/oposicao-vence-primeira-batalha-e-lira-adia-sem-data-votacao-do-pl-das-fake-news/

https://www.migalhas.com.br/quentes/385771/moraes-manda-pf-ouvir-diretores-do-google-sobre-pl-das-fake-news

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